ARTIGOS

17 de agosto de 2021

Aços para construção mecânica

Aço construção mecânic
Os materiais de engenharia (ou mesmo para construção mecânica) referem-se ao grupo de materiais que são usados na construção de estruturas e componentes feitos pelo homem. A principal função de um material de engenharia é suportar cargas aplicadas sem quebrar e sem exibir deflexão excessiva. As principais classificações de materiais de engenharia incluem metais, polímeros, cerâmicos e compostos.

Figura 1 – Componentes para construção mecânica. Fonte: [1].

Enquanto aços estruturais são normalmente fornecidos para atender requisitos mecânicos (com alguns limites de composição química com objetivo de aumento de soldabilidade, por exemplo), aços para a construção mecânica são usualmente fornecidos para atender faixas de composição química. [2]

Aços para construção mecânica

Os aços para construção mecânica (ou baixa liga) podem ser divididos em dois grupos: aços para beneficiamento e aços para cementação. Os aços para beneficiamento, geralmente, possuem um teor de carbono acima de 0,25%, enquanto os aços para a  cementação possuem um teor até 0,25%, e ambos podem ser ligados ou não. Vale ressaltar, que o termo beneficiamento se refere aos tratamentos térmicos de têmpera e revenimento.

Alguns aços de baixa liga são designados como High-strength low-alloy steel (HSLA), ou aços de baixa liga e alta resistência. O que diferencia os aços HSLA de outros aços de baixa liga é que eles são projetados para atingir propriedades mecânicas específicas, em vez de atender a uma composição química específica.

Os aços de baixa liga contêm menos de 8% do total de componentes de liga, e são normalmente mais fortes do que os aços carbono e apresentam boa resistência à corrosão. Estes aços são normalmente chamados de aço para construção mecânica, uma vez que suas propriedades e qualidade são ideais para componentes das máquinas em geral, desde grandes prensas, carros e caminhões, até máquinas menores.

Os aços de construção mecânica são ligas de ferro-carbono e podem apresentar  elementos como níquel, cromo, manganês, tungstênio, molibdênio, vanádio, silício, cobalto e alumínio em sua composição. Esses elementos influenciam nas propriedades dos materiais de acordo com sua proporção com outros elementos presentes.

De maneira geral, e disponível na indústria brasileira, temos os principais aços para construção mecânica: SAE 1335, 4037, 4130, 4140, 4340, 4615, 5120, 5140, 8620, 8640.

Estes aços apresentam elementos em quantidades baixas em peso que contribuem para suas propriedades mecânicas. Aços-liga são divididos em dois grupos: aços baixa-liga e aços alta-liga. Existem definições que a diferença está em 4,0%, enquanto outras definem como 8,0%. No cotidiano, a frase “aço ligado” refere-se a aços de baixa liga, que são aços voltados principalmente ao elementos de máquinas, os aços para construção mecânica.

A rigor, todo aço tem sua liga, mas nem todos os aços são chamados de “aço ligado”. Os aços apresentam ferro ligado com carbono. No entanto, a “liga de aço” é o termo padrão que se refere aos outros elementos químicos nos aços. As normas como ASTM, SAE, AISI, etc, são responsáveis pela nomeação dos aços, levando em conta as suas ligas. Os ligantes comuns são Mn, Ni, Cr, Mo, V, Si e B. Os menos comuns são Al, Co, Cu, Ce, Nb, Ti, W, Sn, Zn, Pb e Zr. Aços mais “ligados’’ são os, por exemplo, aço ferramenta, mas não vamos discutir esse tópico aqui”.

A nomenclatura dos aços de construção mecânica segundo a norma SAE/AISI, são formadas por quatro algarismos, em que:

Figura 2 – Norma SAE. Fonte: Autor

Existe uma grande variedade de propriedades em aços que sua liga proporciona, tais como: resistência, dureza, tenacidade, resistência ao desgaste, resistência à corrosão, temperabilidade e dureza a quente.

Possuem uma grande aplicabilidade e são muito utilizados na fabricação de elementos mecânicos, como por exemplo, engrenagens, eixos, mancais. Quando projetado, é necessário verificar qual será a aplicação para melhor escolha do material, pois a propriedade do aço muda de acordo com a sua composição.

 

Engrenagens 

Aços de construção mecânica são muito utilizados na produção de engrenagens devida suas propriedades, pois o material utilizado deve apresentar boa resistência mecânica, resistência ao desgaste, resistência a fadiga e boa usinabilidade. Os aços utilizados em engrenagens podem passar por tratamentos térmicos para aumentar a dureza em sua superfície, pois ocorre muito desgaste superficial nas engrenagens.

Figura 3- Engrenagens cilíndricas de dente reto. Fonte: [3]

Nas engrenagens e elementos mecânicos, é muito comum utilizar aços de construção mecânica como:

  • 1020: Aço carbono muito utilizado para a cementação. Apresenta boa forjabilidade, soldabilidade e baixa resistência, usinabilidade. Muito utilizado em engrenagens, eixo, virabrequins, pino guia; 
  • 1040: Aço de boa resistência mecânica, usinabilidade e baixa soldabilidade. Possui médio teor de carbono, utilizado em componentes que exigem maior resistência em relação aos aços de baixo carbono; 
  • 1050: Aço de médio carbono possui ligas de carbono, silício, manganês, fósforo e enxofre. Apresenta boa relação entre resistência mecânica e resistência a fratura, pouca temperabilidade. Utilizado em componentes de máquinas, eixos, engrenagens, pinos, parafusos;
  • 8620: Aço para cementação e posterior beneficiamento ligado ao cromo, níquel e molibdênio. Apresenta boa usinabilidade, temperabilidade, soldabilidade e resistência a impactos. Aço AISI série 8000, é um metal ferroso, aço de liga leve, de baixo carbono. Muito utilizado na fabricação de engrenagens, mandris, pinos guia, eixos estriados, rolamentos, buchas, eixos de caminhões, pinhões diferenciais, pinos rei, mangas, pinos de pistão, catracas, etc.
  • 8640: Aço para beneficiamento de médio carbono e baixa liga, apresenta boa usinabilidade, média temperabilidade, baixa capacidade de soldabilidade. É muito utilizado em peças que exigem alta resistência e tenacidade como: engrenagens, eixos, parafusos, virabrequins, bielas, rolos para laminação e lingotamento contínuo;
  • 4320: Aço para beneficiamento ligado ao cromo, níquel e molibdênio, baixo teor de carbono, apresenta média temperabilidade e resistência mecânica, boa soldabilidade, baixa capacidade de usinagem. Muito utilizado em engrenagens, cruzetas, componentes de máquina; [4]
  • 4140:. Aço para beneficiamento, ligado ao cromo, molibdênio, manganês contendo aço de baixa liga. Possui alta resistência à fadiga, resistência à abrasão e ao impacto, tenacidade, resistência à torção e média temperabilidade; 
  • 4340: Além dos elementos químicos presentes no 4140 possui níquel em sua composição, isso garante maior tenacidade, dureza e resistência à tração. Muito usado em eixos, engrenagens, engrenagens planetárias, colunas, mangas, cilindros, ou sistemas de aplicações estruturais;
  • 5115/5120: Ligado ao manganês e cromo. Apresenta média temperabilidade, resistência mecânica e boa usinabilidade, soldabilidade. Aço para cementação e beneficiamento, muito usado em engrenagens, eixos, virabrequins e peças que exigem boa dureza superficial. [4]

Alguns aços são aplicados em situações altamente exigentes, como nas pás de turbinas de motores a jato ou mesmo em reatores nucleares. Por conta das propriedades ferromagnéticas do aço (principalmente por serem basicamente Fe), algumas ligas de aço podem ser aplicadas devido a respostas ao estímulo magnetismo, por exemplo, em eixos de motores elétricos e em transformadores.

Abaixo, a lista da nomenclatura dada pelo SAE destes aços:

SAE Composição Química
13xx Mn 1.75%
40xx Mo 0.20% or 0.25% or 0.25% Mo & 0.042% S
41xx Cr 0.50% or 0.80% or 0.95%, Mo 0.12% or 0.20% or 0.25% or 0.30%
43xx Ni 1.82%, Cr 0.50% to 0.80%, Mo 0.25%
44xx Mo 0.40% or 0.52%
46xx Ni 0.85% or 1.82%, Mo 0.20% or 0.25%
47xx Ni 1.05%, Cr 0.45%, Mo 0.20% or 0.35%
48xx Ni 3.50%, Mo 0.25%50xxCr 0.27% or 0.40% or 0.50% or 0.65%
50xxx Cr 0.50%, C 1.00% min
50Bxx Cr 0.28% or 0.50%, and added boron
51xx Cr 0.80% or 0.87% or 0.92% or 1.00% or 1.05%
51xxx Cr 1.02%, C 1.00% min
51Bxx Cr 0.80%, and added boron.
52xxx Cr 1.45%, C 1.00% min
61xx Cr 0.60% or 0.80% or 0.95%, V 0.10% or 0.15% min
 86xx Ni 0.55%, Cr 0.50%, Mo 0.20%.
87xx Ni 0.55%, Cr 0.50%, Mo 0.25%.
88xx Ni 0.55%, Cr 0.50%, Mo 0.35%.
92xx Si 1.40% or 2.00%, Mn 0.65% or 0.82%or 0.85%, Cr 0.00% or 0.65%
94Bxx Ni 0.45%, Cr 0.40%, Mo 0.12%, and added boron
ES-1 Ni 5%, Cr 2%, Si 1.25%, W 1%, Mn 0.85%, Mo 0.55%, Cu 0.5%, Cr 0.40%, C 0.2%, V 0.1%

SMITH, WILLIAM and HASHEMI, JAVAD, Foundations of Materials Science and Engineering.

 

Mancais

Figura 4- Mancal para laminação. Fonte: [5]

Os mancais são elementos de máquina essenciais para apoio de eixos, portanto são sujeitas principalmente às forças de atrito. São muito utilizados na siderurgia para apoio de fornos conversores a oxigênio, no lingotamento contínuo (mesa de rolos) e laminação, mas existem diversas outras aplicações na construção mecânica.

São compostos por: um anel externo, elementos rolantes, um anel interno e uma gaiola, como mostra a Figura 2. Os aços mais utilizados na produção de mancais são os aços de alto carbono, tratados termicamente com têmpera e revenimento. Pode-se utilizar aços com baixo carbono no estado cementado, pois com a introdução de carbono na  superfície, aumenta a dureza superficial e o núcleo permanece tenaz.

Geralmente, os problemas mais comuns para a troca dele estão associados ao desgaste não uniforme, fadiga de contato, trincas e má lubrificação. São fabricados com aços com boa resistência mecânica e tenacidade, logo esses materiais possuem alto teor de carbono.

Devido às falhas de fadigas, alguns rolamentos de grande porte e cônicos são fabricados com aços de cementação como: 4340, 8620 e 4620. A camada cementada pode atingir até 58 HRC de dureza, enquanto o núcleo, temperado e revenido apresenta uma dureza de 45 HRC. Essa camada pode resistir ao desgaste, suportar cargas elevadas e aumentar a resistência à fadiga, enquanto o núcleo permanece tenaz. [6]

Outro aço muito utilizado é o SAE 52100, que possui alto teor de carbono, ligado ao cromo. Possui alta dureza, temperabilidade, resistência ao desgaste e baixa soldabilidade. Entretanto, um dos problemas é a necessidade de revenimento em temperaturas muito baixas para a obtenção da alta dureza e se evitar o efeito de fragilização da martensita revenida.[6]

Composição química SAE 52100:

Carbono (C) 0,98 – 1,1 %
Manganês (Mn) 0,25 – 0,45 %
Cromo (Cr) 1,3 – 1,6 %
Fósforo (P) Máx. 0,025 %
Silício (Si) 0,15 – 0,30 %
Enxofre (S) Máx. 0,025 %


Usinagem

Figura 5 – Fresa. Fonte: [7]

O processo de usinagem depende da qualidade da ferramenta, velocidade e avanço de corte, como também das propriedades do material, como dureza, ductilidade, resistência, sua composição química, microestrutura e tratamento térmico.

Baixa dureza e resistência mecânica são fatores positivos. Uma boa usinagem depende da relação de dureza e ductilidade, material muito dúctil não é vantajoso nesse processo.

Elementos de liga influenciam na usinagem, como por exemplo, o enxofre, cobre e o chumbo melhoram a usinabilidade enquanto vanádio, molibdênio e tungstênio não possuem efeitos negativos na usinabilidade. Os materiais com baixa porcentagem de carbono e alto teor de enxofre e manganês, também são fatores positivos no processo. [8]

 

Seleção de aços ligados

A dificuldade na escolha do melhor aço para determinada aplicação é saber identificar quais propriedades são mais relevantes, visto que nem sempre todas elas terão a mesma importância durante a realização do projeto.

Entre os aços ligados, é válido assumir para fins práticos que todas as composições, quando temperadas para uma mesma dureza, possuem as mesmas propriedades de tração. De modo geral, a seleção entre os aços ligados, será definida principalmente pelo custo e temperabilidade. [2]

A temperabilidade se refere à capacidade de formação da fase martensítica no aço. Essa formação é influenciada pela composição química do aço, ou seja, certos elementos terão maior ou menor impacto no crescimento martensítico.

Em geral, quanto maiores forem as quantidade de Carbono, Manganês, Molibdênio e Cromo no aço maior será a temperabilidade. Para o conhecimento dessa propriedade são realizados ensaios, dentre eles os mais conhecidos na área metalúrgica são o ensaio Jominy e o ensaio Grossmann.

Conhecido também como resfriamento de extremidades, o método Jominy é o mais utilizado na indústria. O ensaio Jominy é determinado pela Norma ABNT NBR 6339 e serve para determinar o teor de martensita ao longo do corpo de provas em diferentes taxas de resfriamento. [9]

O ensaio consiste no aquecimento do material até a temperatura austenítica e posteriormente no resfriamento por meio da submersão ou exposição a jatos de água em condições pré-definidas.

Após o ensaio são obtidas curvas de temperabilidade, que relacionam a dureza  do material em análise com seu comprimento da seção longitudinal. A velocidade do resfriamento interfere diretamente nas fases que serão obtidas, em geral a extremidade mais exposta ao jato de água é onde se encontra maior dureza, como mostra a Figura 3. Por meio dessas curvas é possível prever a dureza do material em determinada rota de resfriamento e com base na aplicação selecionar o melhor aço.

Figura 6 – Curva de dureza em relação a distância da extremidade. Fonte:[10].

 

Conteúdo não pode ser publicado ou redistribuído sem prévia autorização.
Elaboração e Edição: Thiago Cortiz e Renata Brandolin

 

Referências Bibliográficas

  • https://pixabay.com/pt/photos/engenharia-mec%c3%a2nica-gear-2993233/
  • COSTA E SILVA, A. L. e MEI, P. R. Aços e Ligas Especiais, Sumaré, SP. ELETROMETAL Metais Especiais, 1988.
  • Disponível em: <https://pixabay.com/pt/photos/kawasaki-oldtimer-autom%c3%b3veis-gear-4634216/https://pixabay.com/pt/photos/kawasaki-oldtimer-autom%c3%b3veis-gear-4634216/>. Acesso em agosto de 2021.
  • Disponível em <https://www.ggdmetals.com.br/wp-content/uploads/2015/07/CatConstrucao.pdf>. Acesso em agosto de 2021.
  • KUBO, J; SUZUKI, N.. Modification Method of Back-up Roll Bearing by Replacing oil film bearing with rolling bearing. JTEKT Engineering Journal English Edition No. 1004E (2008).
  • MARCOMINI, José B.. Caracterização da nova liga Fe-C-Mn-Si-Cr: fragilização da martensita revenida e curvas de revestimento. Tese (Doutorado) – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. 2012.
  • Disponível em: <https://pixabay.com/pt/photos/fresas-aparas-de-metal-ferramenta-3738903/>. Acesso em agosto de 2021.
  • Disponível em <http://sites.poli.usp.br/geologiaemetalurgia/Revistas/Edi%C3%A7%C3%A3o%2011/artigo11.13.pdf>. Acesso em agosto de 2021.
  • SIQUEIRA, Bernardo F.. Projeto, construção e teste de um aparato Jominy para ensaios de temperabilidade. Trabalho de Conclusão de Curso em Eng. Mec. Universidade Federal do Pampa.
  • Callister Jr., W. D. Fundamentos da ciência e engenharia de materiais. Rio de Janeiro: LTC Editora, 1997.